(...)

"Mas eu não quero ir ter com os loucos", observou Alice.
"Não tens alternativa". Retorquiu o Gato.
"Nós aqui somos todos loucos. Eu sou louco, tu és louca".
"Como é que sabes que eu sou louca?" perguntou Alice.
"Deves ser", disse o Gato, "ou não terias vindo até aqui".

20080627

Frio

Frio.
Assim é esse teu impetuoso coração.
Egocêntrico narcisismo teu que quimericamente me hipnotiza, me transmite esse falso calor fulgoroso de que na verdade és destituída. Atroz Fevereiro imerso de crueldade, fazes-me crer sem necessidade de ver e sentir sem precisar tocar...condenaste-me a alma a uma eternidade atroz e pavorosa quando olhaste dentro de meu peito esburacado...curaste-me as feridas para que aquela que me farias fosse mais verdadeira... impregnas-te a minha incontrolável imaginação com uma inconsolável (até mesmo para mim) e bela utopia. Mas as utopias há muito que findaram... e nem mesmo tu, ó formosa estátua de deusa grega, conseguirás que estas mãos trémulas segurem esse bem que não é meu.

Teimas caprichosamente em caminhar a meu lado numa estrada que só a mim tem visto passar, que só a mim pertence. Teimas... mesmo sabendo que irás ser parada...impedida de continuar, por tua única vontade. Agora que me afasto...que quase já não te consigo observar, impedido pela sensata distância que tu própria impuseste, ainda sentes o mesmo? Ainda possuis essa maldita vontade de profanar os meus pensamentos? Ó esquecimento misericordioso que o tempo tarda em trazer...

Anseio novamente pela solidão, pois já não sei lidar com pessoas, esses desprezíveis seres, ignóbeis e imundos que riem e mentem indiscriminadamente. A essas odeio-as. E a todas a outras também, até mesmo as que sofrem e choram. Faz-me saudades os momentos íntimos em que ainda me deslumbravas... em que descobria arroxeadas flores-de-lotús dentro da tua verdejante imensidão, que tão lenta e docemente me dominava, quais suaves asas de um anjo. Fantástico desejo ilusório. E quão vã é a forma como a mim te diriges.

Cruel é o teu abandono e desleal a tua presença.
És cisne e carcereiro, orquídea e cipestre... és carta de amor e sentença de morte.
Promessa eterna de uma fugaz névoa matinal, ilusória.

(Não deixando de o fazer) Não mais te quero sentir.

2 comentários:

Anónimo disse...

Estava a ler o teu texto de novo, agora, e apercebi.me de que sabia uma parte de cor !


Este é, sem dúvida, um dos que me toca mais... e que me faz "sofrer" mais. Revejo.me um bocado no texto **)



Este excerto é divinal (!): "Faz-me saudades os momentos íntimos em que ainda me deslumbravas... em que descobria arroxeadas flores-de-lotús dentro da tua verdejante imensidão, que tão lenta e docemente me dominava, quais suaves asas de um anjo."

A Mãe Filósofa disse...

Ainda me impressiona o facto de o sofrimento poder ser tão pessoal e tão universal em simultâneo.Queria dizer-te que adorei este texto porque revi nele o meu presente e gostaria de ter esta capacidade criativa que tu tens para me expressar. Está excelente.